Flexibilidade de horário está entre os principais motivos para mulheres abraçarem o empreendedorismo.
Para Adriana Fontes, 43 anos, o empreendedorismo está diretamente ligado à sua decisão de ser mãe. “Antes mesmo de engravidar, eu sabia que queria curtir meu filho. Venho de uma infância em que meus pais tinham que me deixar com a minha avó e tinham dificuldade de acompanhar meu crescimento. Eu tinha um bom emprego, mas sabia que o mercado ainda tinha resistência para apoiar as mães”, diz. Com um filho de 9 anos atualmente, Fontes relata que consegue se dividir entre a maternidade e seus dois negócios: a marca Dri Fontes, em que oferece cursos de conteúdo digital, e o e-commerce de papelaria criativa Rabisco.
A primeira tentativa de ter um negócio foi com um e-commerce de semijoias, fundado em abril de 2016. “Tinha uma pequena reserva financeira para fazer um estoque. Tinha conhecimento em e-commerce, mas não entendia nada de joia e de moda”. No mesmo ano, em novembro, encerrou as atividades. Depois, criou uma papelaria personalizada de produtos para festas. “Entendi que precisava colocar minha cabeça em ordem para gerir um negócio”. O empreendimento funcionou durante todo o ano de 2017, mas também fechou. “Não sabia precificar, não me dava lucro.”
“É muito difícil porque saí de uma empresa em que tinha liberdade financeira, e tinha um filho pequeno em casa que também dependia de mim. Eu aproveitava o tempo que ele estava na escolinha para me dedicar ao negócio, e quando ele estava em casa o meu tempo era dele. Era minha forma de diminuir minha culpa e minha frustração”, diz.
As experiências fizeram Fontes ir em busca de capacitação para empreender, especialmente relacionados à gestão e autoconhecimento. Em 2018, conheceu a Rede Mulher Empreendedora, e começou a dar palestras com dicas de publicidade em novembro de 2019. Foi quando fundou o Dri Fontes para oferecer cursos de produção de conteúdo, métricas e mídias digitais, entre outros. Em agosto de 2023 apostou em uma papelaria dentro de um shopping, a Rabisco. O negócio está prosperando, mas agora funciona apenas no e-commerce. “Me faltou braço, e tive que tercerizar o tempo do meu filho. Não estava dando conta de cuidar de tudo, e ficou muito puxado”, diz. “Ainda é corrido, mas consigo me organizar bem na rotina que tenho hoje”, afirma.
Dados atestam a escolha de Fontes de empreender para passar mais tempo com os filhos. Segundo a pesquisa Empreender e a Maternidade, realizada pelo Sebrae-SP com 800 mães empreendedoras do estado de São Paulo, 54% das mulheres decidiram ter o próprio negócio o fizeram pelo mesmo motivo.
Outro número, da Pesquisa IRME 2023, realizada pelo Instituto Rede Mulher Empreendedora (IRME) com apoio da Rede Mulher Empreendedora e execução do Instituto Locomotiva, diz que 77% das mulheres começaram a empreender depois da maternidade.
“Pode parecer que as mulheres empreendem porque elas querem, mas nem sempre é assim. Muitas são empurradas para o negócio próprio porque foram demitidas após a licença-maternidade ou estavam em empresas sem o acolhimento necessário para uma mãe”, diz Ana Fontes, fundadora e CEO da Rede Mulher Empreendedora. “O empreendedorismo, de fato, oferece mais flexibilidade para a mulher decidir seus horários. Mas ela trabalha mais, e essa é a grande pegadinha. Ela consegue controlar melhor seu tempo, mas ainda é difícil e nem sempre ela terá toda a disponibilidade para seus filhos, já que também precisa se dedicar aos negócios para que dê certo.”
Mais flexibilidade na rotina
A rotina de mãe empreendedora pode não ser fácil, mas as mulheres entrevistadas por PEGN concordam que vale a pena. É o caso de Agda Pereira, 40 anos, que trabalhou desde os 15 no setor de alimentação, na cozinha e no atendimento. Mãe de três filhos, de 20 anos,12 anos e 3 meses, ela diz que sempre foi difícil conciliar o emprego e a maternidade. “Eu tinha que cumprir horário e não conseguia acompanhar as reuniões escolares nem buscá-los na escola”, diz. “Era muito dolorido. Eu fazia ligações escondidas no banheiro para minha família para saber se eles estavam bem.”
Há nove anos, fundou o Point da Nega, uma lanchonete que funciona na frente de sua casa em Santo André, região metropolitana de São Paulo. Atualmente, o estabelecimento fica aberto para alimentação no local na parte de tarde, e funciona por delivery na parte da noite. A empreendedora recebe de 30 a 50 pedidos por dia, incluindo lanches, marmitas e porções.
O negócio foi fundado com a ajuda de uma vizinha. “Ela me disse que eu tinha o dom para cozinhar e ela me ajudaria com R$ 200 para eu começar a fazer lanches para vender”, diz Pereira. Ela começou o empreendimento dentro de casa. “Divulgamos para pessoas próximas e nas redes sociais, e passei a crescer com vendas dentro do bairro.” Em seis meses, contratou um motoboy para fazer as entregas.
Hoje, a empreendedora segue firme no cuidado dos três rebentos, dividindo a responsabilidade com o marido e contando com a ajuda dos filhos maiores na atenção à bebê. “Meu marido é autônomo e às vezes consegue me ajudar na cozinha. Mas se a bebê começar a chorar paramos na hora para ver o que ela precisa”, diz.
Fora da zona de conforto
Lislaine Vilner, 30 anos, não corria o risco de ser demitida após a licença-maternidade — ela trabalhava como funcionária pública municipal, na cidade de Mafra (SC). “Eu ficava o dia todo fora na época em que era concursada, e meu filho ficava com meus pais. Ele dormia durante a noite, então eu acabava ficando sem participar ativamente. Vivenciava minha maternidade somente aos finais de semana”, diz Vilner. Depois que pediu demissão, em 2022, decidiu empreender. “A vontade sempre esteve presente, mas estava adormecida porque eu estava na zona de conforto. Meu filho me deu coragem para arriscar”, diz.
Em junho do mesmo ano, inaugurou uma franquia Mr. Fit Home, de marmitas congeladas. “Consigo levar meu filho comigo no carro para fazer as entregas durante o almoço, e na parte da tarde ele vai para a escola”, afirma. Segundo a empreendedora, passar mais tempo com a criança deixa seus dias “mais prazerosos e suaves”.
Decisão prévia
Grávida de oito meses, Larissa Gabrielle Ribeiro, 28 anos, não esperou o primeiro filho nascer para ter seu próprio negócio. “Sempre tive o desejo de formar uma família e de empreender, e ‘casou’ de os dois acontecerem ao mesmo tempo. Assim que iniciei o processo de implantação [da franquia da Casa de Bolos], também engravidei”, diz a empreendedora.
Para dar cabo da empreitada, ela deixou o emprego em que estava a dois anos como analista administrativa na área do agronegócio. “Era uma rotina bem cansativa, trabalhava em horário comercial, não tinha tempo para nada”, diz.
Em novembro do ano passado, abriu uma unidade da rede Casa de Bolos, na cidade de Pato de Minas (MG). O nascimento do filho está previsto para o fim deste mês. Ela conta que o negócio será mantido com o auxílio da família. “A minha rede de apoio vai me ajudar neste processo, e conto com o auxílio da minha mãe na unidade para gerenciar os primeiros meses”, diz. “Depois, vou retomando o trabalho junto à equipe. Neste momento, estou me preparando para a jornada de ser mãe e empreendedora.”